sexta-feira, 19 de abril de 2019

1.600 alunos formam a Educação Indígena de Caucaia


Dona Raimunda Rodrigues Teixeira é pajé do povo Tapeba, em Caucaia. Nasceu há 74 anos e nunca saiu de sua tribo. Criou-se dentro dos costumes indígenas, aprendendo os saberes da terra com os antepassados e transmitindo tudo pela tradição oral às novas gerações. “Meu tataravô era cacique e morreu quando eu tinha dez anos. Tudo o que aprendi veio da minha ancestralidade. Tenho conhecimento e sabedoria. Com as bênçãos de pai Tupã, aprendi de ponta a ponta as nossas tradições, os nossos rituais, a nossa medicina, as nossas danças. Mas nunca aprendi a ler e a escrever”, afirma.
/admin/view/noticia/img/20190419125558indios_especial_educacao.jpgPara a pajé, a tradição oral é muito importante, mas tudo que sei está gravado apenas na memória. “Por isso que sempre converso com os jovens e aconselho: leiam, estudem, registrem a história do nosso povo para que ela não se perca; se orgulhem de quem vocês são e passem esse orgulho adiante.”
O incentivo tem um motivo especial: “perdemos nossa língua materna”. Dona Raimunda não quer mais perder nada. Sonha que seu povo tenha asseguradas as três coisas que considera imprescindíveis para a sobrevivência das comunidades indígenas: terra, educação e saúde. 
“Quando eu vejo uma escola indígena, meu coração se enche de alegria porque sei que nossa comunidade se fortalece, que nossos jovens vão aprender Português e Matemática e vão poder exercer profissões. Já temos professores, advogados, enfermeiros, mas eles vão aprender muito além disso. Nas escolas, eles fortalecem o orgulho de serem quem são e de onde vieram e, quanto mais alto cada um deles for, mais força vão ter para lutar para que o nosso povo não volte a ser massacrado, humilhado, escravizado”, afirma a pajé.
No que depender da Prefeitura de Caucaia, dona Raimunda pode ficar tranquila. A educação indígena só tende a ser fortalecida. Prova disso é que em 2019 a escola Aba Tapeba foi a única unidade pública do Ceará selecionada para participar do XXV Encontro Nacional do Programa das Escolas Associadas à Unesco Brasil. Um reconhecimento internacional ao trabalho que vem sendo desenvolvido no município.
Segundo Thiago Anacé, técnico do Núcleo de Educação Indígena da Secretaria Municipal de Educação (SME), “a eficácia da nossa educação consiste em aliar os conteúdos da Base Nacional Comum Curricular [BNCC] a uma proposta específica e diferenciada, em que inserimos na matriz os saberes que estão presentes na comunidade através de uma pedagogia de projetos.”
“A escola escolhe um tema, uma atividade, como nessa semana os Jogos Indígenas – com modalidades próprias da sua tradição – ou a festa da carnaúba, as danças, os rituais e dá a tudo isso uma dimensão pedagógica, uma dimensão curricular”, explica o técnico. 
A proposta é que cada escola indígena elabore seu planejamento a partir da realidade da comunidade em que está inserida, uma vez que o município garantiu um calendário específico para as unidades para que esses povos tradicionais tenham seus conhecimentos reconhecidos, reforçados e valorizados.
“Oferecer um calendário que garanta esses festejos e datas tradicionais é um importante passo. Essa semana, por exemplo, as escolas em todo o Brasil planejam atividades em alusão ao Dia do Índio. E a escola indígena fica com essa liberdade de planejar suas ações de acordo com sua realidade, seu modo de vida, suas tradições, suas crenças, sua identidade”, afirma Thiago. 
Para ele, Caucaia têm se destacado na articulação, diálogo e sensibilidade no respeito e valorização desses povos e dessas pedagogias. “O espaço que eu ocupo hoje na Secretaria de Educação, o fato de existir na estrutura da SME, no seu organograma, alguém para cuidar das causas e questões da educação escolar indígena já demonstra uma preocupação, um cuidado e uma sensibilidade. É uma atitude inovadora e louvável dentre as politicas educacionais do município.”
Números da educação indígena
Atualmente, a rede municipal de ensino de Caucaia conta com cerca de 1.600 alunos divididos em 88 turmas da Educação Infantil ao Ensino Fundamental II, em sete unidades escolares, sendo três escolas e quatro anexos.
São 126 professores e 11 gestores.

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